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Chordophonia - Entrevista a Rui Camacho

18/5/2016

2 Comments

 
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Antes de mais, podes falar um pouco de ti, do teu percurso musical e quando e porquê te surgiu o interesse pelos cordofones madeirenses: Braguinha, Rajão e Viola D’Arame?
O meu interesse pelos cordofones tradicionais vem desde a idade de criança quando vi numa festa, familiares da parte da minha mãe a tocar instrumentos diferentes, estranhos e iguais aos que os grupos de Folclore usavam, mas que ninguém explicava que instrumentos eram aqueles. Sempre me despertou curiosidade por estes instrumentos. Sempre quis saber mais sobre estes cordofones e nunca encontrei explicações com argumentos pela parte da História que me satisfizesse porque eram coisas do povo sem grande importância. Era apenas ignorância dos homens da história e cultura.
Só nos fins dos anos 70, quando frequentava o FAOJ – Fundo de Apoio aos Organismos Juvenis, na Rua 31 de Janeiro tendo como Diretora a Escultora Manuela Aranha, que fora minha professora de artes na EICF, aprendi que era - música tradicional. Conscientes da situação irrecuperável da música e dos instrumentos, em 1980/81, eu e um grupo de amigos criámos um grupo com o objetivo de recolher, inventariar, sistematizar, valorizar e divulgar a música e os instrumentos da tradição popular madeirense, contribuindo desta forma para a preservação daquilo que já nesta época considerávamos como património musical da Região a defender.
O sector erudito não valorizava os instrumentos populares, porque não os compreendia, logo ignorava/não reconhecia. A sua valorização começou a ser feita através do projeto Algozes que em 1990 mudou de nome para Xarabanda, mas mantendo o sentido de procura, o espírito, o respeito constante pela tradição musical madeirense.
Um dos objetivos da AMCXarabanda, é levar  o conhecimento da música e dos instrumentos musicais populares, como algo de valor a preservar e re-interpretar numa postura de respeito pela matriz original. A divulgação foi feita através do grupo “Xarabanda”, de edições de artigos publicados na Revista Xarabanda com o objetivo de introduzir novos dados, ações de sensibilização nas diversas escolas dos diferentes graus de ensino na Região designado por : Vendo, ouvindo e falando da música e dos instrumentos musicais da tradição popular madeirense, uma coleção de postais, um poster sobre Instrumentos Musicais populares da Madeira, de forma organizada e segundo a classificação organológica, vocacionada para a Educação e o público em geral. A edição dos 6 CDs do grupo Xarabanda privilegiando a sonoridade dos cordofones a sonoridade e na comunicação social local e nacional.
 
Na minha casa, sempre houve uma cultura musical constante urbana. Da família  da minha mãe era mais na vertente da música tradicional, do lado da família do meu pai eram músicos da banda dos “Guerrilhas” ou individual. Bisavô era trompetista, Avô tocava fliscórnio, pai bateria ou percussões, tios trompete, viola, primos directos ligados à prática musical na sua maioria cantores de grupos musicais. O meu pai tocou em pequenos grupos não conhecidos e chegou a ir ao estúdio do PEF - posto Emissor do Funchal cantar com os meus tios canções em voga na época. Sou primo legítimo do Sérgio Borges, cantor do “Conjunto Académico João Paulo” da década de 60/70. Em 1976 iniciei os conhecimentos musicais de leitura e prática instrumental em flauta Bisel no FAOJ com o professor Juvenal Abreu, que era o viola baixo do grupo de jazz “OFICINA”, e na viola com o professor Humberto Fournier, que também era na altura o guitarrista do “Oficina”. Depois fui para a Banda dos Guerrilhas aprender trompete, como não tinha lábios para tocar trompete, porque era o meu  instrumento preferido e sonhava ser como Louis Armstrong (foi a minha primeira influencia de música estrangeira que ouvira na rádio e mais tarde na TV), por sugestão do professor mudei para  o saxofone.
Aos 19 anos, fui cumprir o serviço militar para o Continente e quando regressei à Madeira, ingressei no Conservatório de Música da Madeira, na disciplina de flauta com o prof. Agostinho Bettencourt, durante 6 anos com o meu irmão, o José Camacho.  Paralelamente, e desde 1981, era músico responsável e fundador do projecto de recolha e divulgação da música e dos instrumentos populares madeirenses “Algozes” que mais tarde mudamos de nome para Xarabanda. Como músico tive uma breve passagem pelas  Orquestras de Música Antiga do Gabinete Coordenador de Educação Artística em 1986/88, onde tocava flauta de bisel tenor e 1990/91 pela Orquestra Ligeira da Madeira como percussionista. Projeto musical fundado pelo meu irmão, Joel Camacho. Participei durante alguns anos em grupos de carnaval ensinando os ritmos de marcha brasileira e samba, isto nos primeiros anos da década de 80. Em relação aos cordofones em questão, considero que estes são BENS DE INTERESSE CULTURAL PARA A REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA. São portadores de referencia e identidade cultural dos madeirenses.
 
De acordo com a minha experiência estes instrumentos sobreviveram graças à dinâmica dos tocadores populares existentes um pouco por toda a ilha e à persistência dos diversos grupos de Folclore desde 1938, ao trabalho realizado pelo jornalista e músico Carlos Santos, autor de três livros sobre a tradição musical madeirense, os quais foram importantes referencias para o estudo dos instrumentos e da música tradicional regional. 
Várias vezes fui convidado para orientar ações de formação sobre instrumentos populares da Madeira e apresentar comunicações sobre cordofones tradicionais madeirenses na região e em Lisboa. A Organologia é uma área do meu interesse. Desenvolvi um trabalho de sistematização dos instrumentos musicais da tradição popular madeirense, organizei duas exposições sobre este assunto "Património Musical da Madeira", uma edição de postais sobre os instrumentos populares da Madeira e um poster organizado de acordo com a  organologia. Coordenei, inventariei, classifiquei e escrevi para uma Edição de um CDROM sobre Instrumentos Musicais  da Tradição Popular Madeirense" em parceria com GCEA. Participei como músico em 6 edições discográficas sob a minha coordenação. Em 2008 no âmbito dos "500 Anos da cidade do Funchal, tive a meu cargo a coordenação e produção musical intitulado "Veredas da Atlântida - uma caminhada simbólica"  com 15 tema originais e 40 músicos de diferentes áreas musicais.
 
Há uma dúvida pertinente em relação aos cordofones, a denominação 'madeirenses' existe porque são originários da Madeira ou são oriundos de outro sítio mas são de facto uma marca na tradição madeirense?
Os nomes dos cordofones populares de tradição são originais da Madeira - endémicos, quer dizer que são  usados só na Madeira: braguinha, rajão e viola de arame, o que quer dizer que são nomes dados pelos próprios madeirenses há séculos, conservados até hoje. Temos conhecimento da designação popular destes 3 cordofones desde o século XIX. São sim, uma marca cultural madeirense.
 
É possível traçar uma espécie de árvore cronológica destes instrumentos? As suas origens e quando chegaram a Portugal e especificamente à Madeira? 
É importante aqui referir que, a origem de qualquer instrumento musical de tradição popular é sempre incerta, controversa e historicamente complexa. Por exemplo, falta de informação a nível da iconografia musical, e outros registos documentais, não nos permite avaliar com rigor esta questão. Sabemos que segundo dados históricos existente no Arquivo Regional da Madeira e na Torre do Tombo em Lisboa História, foi no século XV que partiram os primeiros povoadores para a Madeira e por lógica foram os primeiros povoadores que trouxeram consigo os referidos cordofones.
 
Para melhor compreender a questão de origem, o antropólogo Mesquita Lima no seu livro “Introdução à Antropologia Cultural” refere que todas as culturas  possui a sua própria história, entra em contacto com outras, que influencia ou é influenciada por elas, vai-se modificando com o tempo, transforma-se, e amplia o seu acervo cultural. A minha experiência, permitiu observar que, com o tempo as coisas vão adquirindo particularidades próprias de ser da região, as nossas coisas, que nos diz respeito. Aqui está a razão do sentimento de pertença de identidade cultural de um povo. Toda a inovação passa por um processo de adaptação e aos poucos vai sendo incorporado nos valores da tradição dessa região. Creio que foi assim o caso dos cordofones introduzidos na Madeira há séculos, numa lógica de receber e dar - temos o caso do braguinha que foi levado pelos madeirenses no século XIX  para as ilhas de Havai e deu origem a um outro instrumento muito  popular em todo o mundo com o nome “Ukelele".
Na minha opinião muito modesta sem conhecimentos históricos profundos, o braguinha e rajão são ibéricos. Há  documentos históricos no Arquivo Regional que  diz desde  o inicio do povoamento a Madeira espanhóis e canarinos passaram pela Madeira.
Hoje fazem parte da tradição musical da Madeira e Havai e bem enraizados na vivência da população madeirense.
 
Em que estilos e contextos musicais são/foram os cordofones maioritariamente utilizados e que outras fusões são dignas de destaque?  
Os cordofones tradicionais da Madeira sempre foram usados desde que eu conheço em contextos populares. Festas de carácter popular, arraiais em toda a ilha, sobretudo nas zonas rurais (convívios sociais de amigos, familiares, casamentos etc.) Integrados em grupo de tocadores informais, grupos de folclore, grupos de música popular e mais recente a partir de 1981, com aparecimento do projeto musical Algozes/Xarabanda, de adaptação de música tradicional recriada ou de re-interpretação,  mas com uma postura de respeito pela matriz original. Desde  inicio do século XX o braguinha e o rajão eram usados em agrupamentos, tipo orquestra de cordas em toda a ilha. Na iconografia musical, (pinturas, gravuras e fotografias existente no arquivo do "Museu Vicentes", onde estão diversos espólios fotográficos dos mais diversos fotógrafos profissionais da Madeira),   aparecem sempre estes instrumentos representados, excepto a viola de arame. A viola de arame não era utilizada pelas orquestras de cordas,  apenas aparece a nível individual e espontâneo. O rajão e a viola de arame não têm repertório próprio. Serve apenas de acompanhamento às danças, cantigas tradicionais em geral. O braguinha ou machete tem repertório erudito escrito no século XIX. Recentemente, a partir da década de 2000 alguns músicos mais virtuosos começaram a compor para estes cordofones, motivados pelo Xarabanda através de ações de sensibilização nas escolas, na comunicação social e através de edições. Os exemplos  dos músicos Vitor Sardinha (rajão e viola de arame), Paulo Esteireiro (braguinha), Roberto Moniz, Roberto Moritz (braguinha, rajão e viola de arame),mNuno Nicolau (viola de arame), Pedro Gonçalves, Guilherme Órfão, Vitor  Filipe (viola de arame, braguinha e rajão) e também o músico da área do Jazz, André Santos, que recentemente despertou interesse com muita sensibilidade por estes cordofones, pelo que nos deixa muita expectativa e interesse.
 
Ultimamente existe um crescente interesse por estes instrumentos. A que se deve este despertar? 
No meu entender o trabalho realizado pelo grupo Xarabanda desde 1981, que desbravou um caminho nunca antes feito,  de forma inovadora, chamando a atenção através de atuações/concertos comentados nunca antes feito, ações de sensibilização um pouco por toda a ilha e nas escolas da região e do Contiente. Aquando das comemorações dos 20 anos de atividade do Xarabanda, este grupo percorreu Portugal Continental, de Norte ao Sul, com concertos de divulgação  da música e instrumentos da tradição popular madeirense. Foi a partir do projeto Xarabanda que começou a surgir no panorama musical madeirense outros grupos baseado no modelo Xarabanda. Aos poucos. Não esquecendo também, o papel importante  na formação, e divulgação do Gabinete Coordenador de Educação Artística de então, pesquisando, investigando, editando assuntos relacionados com os cordofones populares da Madeira, sob a orientação do musicólogo, formado em Ciências Musicais pela Universidade Nova de Lisboa, o músico Paulo Esteireiro, que contribuiu para a  valorização  dos cordofones através de trabalhos de investigação de sua autoria e de diversas peças musicais  publicadas para braguinha.
Portanto há um trabalho feito ao longo dos 35 anos com o contributos de muitos: Associação Xarabanda, GCEA/DSEAM, Núcleo de música da Escola S Francisco Franco, os grupos "Encontros da Eira", "Banda d'Além" "Si que brade", os músicos Mário André, Roberto Moniz e Roberto Moritz, Humberto Pedras, da Camacha, Vítor Sardinha, alguns  grupos de Folclore, a Associação "Flores de maio" do Porto da Cruz, "Os Machetinhos  de Machim", de Machico e mais  recentemente o Conservatório de Música da Madeira, tendo como professor o Roberto Moniz.
 
Como gostarias que fosse o desenvolvimento e futuro dos cordofones? 
Um dos objetivos da Associação Xarabanda é contribuir para aumentar o número de praticantes destes três cordofones tradicionais madeirense, melhorar a qualidade técnica, atitude perante este cordofones e ultrapassar o condicionalismo do "Folclore limitado". Criar novo repertório próprio para estes cordofones, criar referencias junto dos mais novos e encher a praça do Município de tocadores numa atitude de convicção assumindo  a sua identidade cultural. Que estes instrumentos sejam uma referencia para os mais novos.
2 Comments
Tara Forrest link
18/12/2020 07:26:30 pm

Hi nice readinng your post

Reply
Peoria Furniture Cleaning link
23/7/2022 02:23:21 am

Great reading your ppost

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    ​ENTREVISTAS:

    Rui Camacho
    Vítor Sardinha
    Paulo Esteireiro
    João Paulo Esteves da Silva
    Jorge Reis
    Carlos Barretto
    Sara Serpa
    Marcos Cavaleiro
    Lars Arens
    Afonso Pais
    Maria João
    Demian Cabaud
    Desidério Lázaro
    André Matos
    André Fernandes
    Bruno Santos
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