Antes de mais fala-me um pouco de ti, do teu percurso e dos momentos que mais te marcaram até hoje. Eu aprendi a cantar praticando Aikido, pertenço à escola do Mestre Georges Stobbaerts desde miúda! Também estive uns meses na escola do Hot, onde conheci tudo, música e músicos via discos que me ofereciam e ao ir aos concertos, mas onde aprendi o meu instrumento foi verdadeiramente através da prática de Aikido. Todos os momentos em que faço música são importantes e marcantes, todos! Que mensagem ou sensações tentas passar na tua música? Não tento passar nenhuma mensagem, faço apenas a música que eu amo à minha maneira. Que qualidades admiras num músico e o que é que define para ti um bom músico? Um bom músico é para mim quem faz a sua música com coração, memória, intelecto, e entranhas. No Jazz, e não só, fala-se muito em respeitar a tradição. Que importância dás ao que se passou para trás? Achas que se respeita a tradição hoje em dia? A memória é muito importante para haver hoje na música, foi preciso haver ontem e é preciso haver amanhã. Ainda em relação à tradição, que corrente mais te influenciou e que discos e músicos foram uma inspiração para ti? E actualmente, que músicos te inspiram? E coisas extra-musicais que sirvam de inspiração? Toda a gente foi e continua a ser uma inspiração, mas sobretudo os sons à nossa volta, tudo o que se passa, as melodias e ritmos constantes todos os dias em todo o lado. Que importância dás ao estudo? Praticaste muito enquanto estudante? Que conteúdos tinham mais ênfase na tua rotina diária? E hoje em dia o que é que praticas? Sim, eu canto todos os dias. Às vezes também na rua, balneário, supermercado, praia, avião... Este é o meu estudo, estou sempre disponível e à escuta. Tiveste ou tens aqueles fantasmas de 'deveria ter estudado o músico x ou o conteúdo y'? Como contrarias isso? Não. Muitas vezes a questão da técnica do instrumento é confundida com número de notas por segundo. O que é para ti a técnica do instrumento? Técnica é a experiência que vais adquirindo, é o teu conhecimento do teu instrumento, que vamos aperfeiçoando com o tempo. E som do instrumento? Que idealizas para o teu som? Procurar todos os sons é preciso. Ficas nervoso quando entras em palco? Fico seeeeeempre nervosa, sempre! Não há remédio :0) E tens ou já tiveste pensamentos parasitas que podem influenciar a tua prestação em palco? Do género 'O que é que estou aqui a fazer?!' 'O público não se cala??' ou 'Está ali a pessoa X na plateia, tenho de tocar bem!'. Como dás a volta? Não, só se falarem alto no público, aí fico mesmo fula e então peço: por favor poderiam ter a gentileza de calar as vossas bocas, e depois digo menos gentilmente um grande e gordo SHIIIIIIUUUUU, e se mesmo assim não se calarem então parto para a violência ;0) Just kidding !! Ouves rádio? Ouço sim, no carro. Interessa-te a música que se faz em Portugal? Qual a tua opinião acerca disso? Este país tão pequenito está recheado de músicos maravilhosos que fazem a sua música às vezes contra ventos e chuvadas. São muito importantes para mim, são uma inspiração e um orgulho constantes. O que andas a ouvir ultimamente? Em jeito de despedida, fala-me do que andas a fazer actualmente e o que é que te imaginas a fazer daqui a 10 anos? Ando a ouvir tudo e mais alguma coisa como de costume, sobretudo sons e batidas electrónicas por causa do meu projecto OGRE, que vai ter disco novo. Também ando a gravar sons por todo o lado e a cantar ritmos para serem samplados. Comecei os concertos com o IRIDESCENTE, continuo a cantar com o David LINX e a Brussells Jazz Orchestra o projecto 'A DIFERENT PORGY AND ANOTHER BESS' com quem gravei e também com o projecto FOLLOW THE SONG LINES com o David LINX, o Diederik WISSELS , e o Mário LAGINHA, que também tem disco. E o OGRE, iremos gravar em Julho o nosso disco em trio com guests. Dou aulas na ESML, licenciatura e mestrado e estou a tirar o mestrado em música/performance. Tomo conta do meu filhote que já é grande 4 cães gigantes e 2 gatinhos E o João Sou activista pelos direitos dos animais Sou praticante de Aikido
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Antes de mais fala-me um pouco de ti, do teu percurso. A música aconteceu por acaso, quando tinha 10 ou 11 anos. Um grupo de amigos formava uma banda e faltava o baixista. Queria fazer parte desta nova brincadeira e então pedi um baixo eléctrico à minha mãe, nem sequer sabia o que era o baixo eléctrico...Comecei a ter aulas particulares mas nada sério da minha parte, tocava alguns temas de rock e não queria saber de praticar nem nada disso. Tocava com um par de bandas e curtia. Com o tempo fui-me interessando mais e quando acabei o liceu entrei no instituto I.T.M.C, uma escola correspondente ao que seria a escola do Hot Clube, e foi aí que me fui interessando cada vez mais pelo jazz. Com o tempo dei por mim a imitar com o baixo, o som do contrabaixo. Então decidi seguir por esta direcção, vendi o baixo eléctrico e comprei o meu primeiro contrabaixo, lembro me que o fui buscar ao atelier do luthier na manhã de 25 de Dezembro de 2000. Comecei a ter aulas formais com Hernan Merlo, o "sr contrabaixista" de jazz de Buenos Aires, durante um ano, ao mesmo tempo já tinha acabado o I.T.M.C e estudava na Berklee International Network. Concorri para bolsas na Berklee em Usa, e ganhei uma interessante. Depois de um ano de estudo com Merlo comecei a estudar com o maestro Miguel Angel Villarroel, que foi quem me "abriu a cabeça" com o método que tinha. Cinco meses depois fui para Boston estudar na Berklee e acabei o curso em 2003. Desde há dois anos que estou na tutoria do maestro Alejandro Oliva, primeiro contrabaixo na orquestra Gulbenkian durante os últimos 35 anos. Que mensagem ou sensações tentas passar na tua música? Tento ser o mais honesto possível comigo e com a música, tocar coisas que representem o que ouço ou sinto. Espero chegar às pessoas, comunicar e criar uma reacção. Que qualidades admiras num músico e o que é que define para ti um bom músico? Admiro a originalidade , no discurso e no som. Também a honestidade e a criatividade, a capacidade de surpreender e não se repetir, de não cair em fórmulas, de se reinventar em cada concerto ou disco mantendo a identidade. Acho que isso também define um bom musico. No Jazz, e não só, fala-se muito em respeitar a tradição. Que importância dás ao que se passou para trás? Achas que se respeita a tradição hoje em dia? Acho que é muito importante perceber o que se passou para trás, mas como ponto de referência e não como verdade absoluta, se calhar como ponto de partida. Parece-me que há muita gente a respeitar a tradição e muita gente estancada nela. Também há gente que não faz ideia do que se passou para trás.... Ainda em relação à tradição, que corrente mais te influenciou e que discos e músicos foram/são uma inspiração para ti? Os trios de Bill Evans, com Scott laFaro/Paul Motian, Chuck Israels/Larry Bunker , Gary Peackok/Paul Motian, e Eddie Gomez/Marty Morrel e DeJohnette foram e continuam a ser sempre impactantes para mim. Charlie Haden com o trio e quarteto do Jarrett, o trio do Jarrett com Peackok. Miles, Coltrane, Mozart, Richard Strauss, Bach, Stravinsky, Monk, etc. E coisas extra-musicais que te inspiram? A minha familia, um bom vinho, um bom livro/ filme, as pessoas sem medo de serem felizes e que lutam para atingir esse fim sem prejudicar outros. Que importância dás ao estudo? Praticaste muito enquanto estudante? Que conteúdos tinham mais ênfase na tua rotina diária? E hoje em dia o que é que praticas? Estudei muito, quando vivia em Boston, estudava mais ou menos 8 ou 9 horas diárias. A contar com aulas e sessões passava 12 a 14 horas no instrumento, uma loucura. Quando mudei para Lisboa ainda tinha a febre e lembro-me de estudar 6 horas, duas semanas depois a vizinhança passou-se, uma senhora do bairro desatou aos berros "chega de musica "##$%&!" e o meu vizinho da frente punha as colunas da aparalhagem à janela e metia musica bem alta, eu fechava a minha janela e continuava, acabou por mudar-se.... Nos últimos anos não estudo muito, 2 ou 3 horas quando tenho tempo e disponibilidade mental. No início a prioridade era aprender a tocar bem o instrumento, hoje também, mas tomando conta de todos os pormenores e com máximo grau de consciência , som, articulação , afinação, postura, etc. Tenho duas partes na minha rotina, estudo muito com arco, técnica e música em geral. A outra parte está determinada com os concertos que tenho pela frente, tento estar preparado o melhor possível. Tiveste ou tens aqueles fantasmas de 'deveria ter estudado o músico x ou o conteúdo y'? Como contrarias isso? Não, nunca tive. Muitas vezes a questão da técnica do instrumento é confundida com número de notas por segundo. O que é para ti a técnica do instrumento? Técnica é o meio para atingir as coisas que ouço na minha mente, a maneira de as organizar para que o discurso seja interessante e esteja relacionado com o momento da musica. Tanto pode ser tocar muitas notas como tocar muito poucas, basicamente acho que é a sensibilidade de estar presente em cada circunstância, e o afastamento das pretensões ou expectativas, sobretudo saber ouvir . E som do instrumento? Que idealizas para o teu som? Hoje em dia não idealizo nada para o meu som, tento ouvir-me sem expectativas . No meu instrumento o som é uma suma de factores importantes e é isso que pratico todos os dias, articulação, afinação, coordenação entre as mãos, etc. Ao vivo quanto mais acústico melhor, por isso tento estar atento ao material existente para conseguir isso. Ficas nervoso quando entras em palco? Nervoso nunca, às vezes sinto alguma ansiedade, mas está relacionado com a música que vou tocar, o grau de dificuldade, etc. Antes acontecia quando tocava com os meus grupos, sendo eu o líder estou mais preocupado com a música, ultimamente acontece menos, também a verdade é que acontecem menos concertos sendo eu o líder... E tens ou já tiveste pensamentos parasitas que influenciam a tua prestação? Do género 'O que é que estou aqui a fazer?!' 'O público não se cala??' ou 'Está ali a pessoa X na plateia, tenho de tocar bem!'. Como dás a volta? Em Boston tive a sorte de estar exposto a tocar à frente de pessoas que admiro e respeito, e acho que fiquei curado no momento em que assumi quem sou e como toco, sem pretensões . Quando tenho um concerto com alguém com quem possa ficar nervoso penso sempre em ser o mais honesto possível, sempre haverá pessoas que gostam do que fazes e pessoas que não, não há nada a fazer para além de sermos felizes com o que somos. Ouves rádio? No carro quando fico farto dos cd que levo. Ouço antena 2 e radio Amália em Lisboa. Às vezes M80. Interessa-te a música que se faz em Portugal? Qual a tua opinião acerca disso? Interessa-me. Há muito boa musica e muita musica horrível aqui, como em todo o lado. Em geral a comunidade nestes últimos anos cresceu muito e fez com que aparecessem grupos e músicos interessantes, pena que haja muitos bons músicos e tão poucos sítios onde tocar. Também há alunos nas escolas com muito potencial e isso dá uma boa perspectiva de futuro. O que andas a ouvir ultimamente? Gosto de ouvir jazz, gosto de bebop, hard bop e coisas mais modernas, ultimamente confesso não ter tanta pachorra para estar a par do que acontece, há muita musica e muitos músicos. Ouço fado, tango e folclore Argentino, musica com raízes , Bill Evans, Drew Gress, Herbie Nichols, Paul Bley, Monk. Também gosto de ouvir os discos do pessoal, discos antigos e novos de colegas. Em jeito de despedida, fala-me do que andas a fazer actualmente e o que é que te imaginas a fazer daqui a 10 anos? Actualmente estou no processo de editar o meu 4º disco pela editora Fresh Sound (com Ernesto Jodos no piano, eu no contrabaixo, e o Marcos Cavaleiro na bateria) e estou a tentar arranjar concertos para o lançamento , nada fácil nos dias que correm. Tenho bastantes coisas com a OJM e alguns projectos dos quais estou contente por fazer parte. Daqui a 10 anos espero ter acabado de pagar a minha dívida à segurança social e continuar a fazer o que faço agora, tocar, praticar e viver em paz. http://demiancabaud.com/ Antes de mais fala-me um pouco de ti, do teu percurso. Estou envolvido na música desde os 6 anos e desde os 15 que decidi que seria músico. Nesse sentido, muitas das expetativas e projeções de uma vida enquanto adulto ficaram logo resolvidas nesse momento. Sou músico hoje e tudo se encaminhou de uma forma natural, tendo passado pelas escolas clássica (Conservatório de Faro e Setúbal), jazz (Hot Clube e Conservatório de Amsterdão) e de "rua" (vocalista de uma banda de rock, outros projetos pop). Que mensagem ou sensações tentas passar na tua música? Todas as que sentir no momento, enquanto músicos somos também atores e é um desafio viver a viagem de cada composição que se toca com as suas emoções inerentes. Que qualidades admiras num músico e o que é que define para ti um bom músico? Admiro precisamente essa capacidade de se envolver com a música que se está a tocar a partir do primeiro segundo, sem preconceitos, sem academismos, sem ego. No Jazz, e não só, fala-se muito em respeitar a tradição. Que importância dás ao que se passou para trás? Achas que se respeita a tradição hoje em dia? Dou total importância à tradição, ferramenta fundamental para se compreender tudo o que se faz e o que se fará. A tradição respeita-se em quem a respeita. É-me difícil fazer uma análise global, mas diria que não suficientemente. "Nesse grande futuro, não podemos esquecer do nosso passado." - Bob Marley Ainda em relação à tradição, que corrente mais te influenciou e que discos e músicos foram/são uma inspiração para ti? O hard-bop. Coltrane, Miles, Wayne Shorter, Herbie Hancock, Bill Evans, Cannonball, Sonny Rollins, Hank Mobley E coisas extra-musicais que te inspiram? Artes marciais, meditação segundo a tradição budista, cinema, videojogos. Que importância dás ao estudo? Praticaste muito enquanto estudante? Que conteúdos tinham mais ênfase na tua rotina diária? E hoje em dia o que é que praticas? Total importância ao estudo. Pratiquei bastante, tenho pena de não ter a energia que tinha há 15 anos atrás mas hoje em dia também tiro mais partido do tempo que estudo. Tento (e tentava) dar foco a três aspetos que considero fundamentais: técnica, linguagem e improvisação Tiveste ou tens aqueles fantasmas de 'deveria ter estudado o músico x ou o conteúdo y'? Como contrarias isso? Tive e tenho de vez em quando, cada vez menos. Contrario agarrando-me a um pensamento que me tem acompanhado: a vida é longa, há tempo para tudo, para estudar tudo o que quisermos, a fundo. É preciso só paciência. Muitas vezes a questão da técnica do instrumento é confundida com número de notas por segundo. O que é para ti a técnica do instrumento? Técnica é tudo, som, ataque, articulação, afinação, dedos. Diria até que a rapidez dos dedos é o lado mais fácil da técnica. E som do instrumento? Que idealizas para o teu som? Idealizo tocar sempre relaxado, soprar bem, isso vai-se transformar logo num ótimo som. Ficas nervoso quando entras em palco? Fico. E tens ou já tiveste pensamentos parasitas que influenciam a tua prestação? Do género 'O que é que estou aqui a fazer?!' 'O público não se cala??' ou 'Está ali a pessoa X na plateia, tenho de tocar bem!'. Como dás a volta? Tenho, sim, e já tive. Tento concentrar-me na música que estou a fazer, se não tiver a tocar tento concentrar-me no que os outros estão a tocar ou na minha respiração. Ouves rádio? Oiço, Antena2. Interessa-te a música que se faz em Portugal? Qual a tua opinião acerca disso? Interessa. Portugal precisava de um aspirador. Há uma cortina de fumo à volta que não permite que os músicos sejam livres para criar e para se sentirem músicos. A profissão é sub-valorizada, problema grave. Temos cada vez mais músicos mas não necessariamente qualidade. Não por falta dela mas porque há pouco espaço. O que andas a ouvir ultimamente? Música clássica. Em jeito de despedida, fala-me do que andas a fazer actualmente e o que é que te imaginas a fazer daqui a 10 anos? Ando a preparar mais um disco do trio. Daqui a 10 anos imagino-me fora de Portugal, não sei ainda a fazer o quê. Antes de mais fala-me um pouco de ti, do teu percurso. Cresci a ouvir muita música diferente e desde muito cedo a fingir que tocava vários instrumentos. Comecei a ter aulas de guitarra aos 10 anos, na escola onde andava, com o Professor Fernando Valente e paralelamente em casa com o Pedro D´Orey. Aos 13 fui para a Escola Acorde Comigo (dos pais do Francisco Pais) onde tive oportunidade de ter aulas com António Sousa, Mário Delgado, Pedro Madaleno, Iuri Daniel, entre muitos outros e bons músicos de jazz. Foi aí que comecei a ter mais contacto com o Blues, a improvisação e a tocar alguns standards. Era pouco disciplinado, mas acho que os ensinamentos desse período foram essenciais. Aos 18 fui para o Hot Clube e Academia De Amadores de música. No Hot foi bom, estive pouco tempo (1 ano), não tive oportunidade de conhecer melhor as pessoas (era tímido nessa altura), nem de ir mais além daquilo que eu já tinha na bagagem. Na Academia foi um desastre. Aos 19 fui para a Berklee College of Music, foi muito bom, conheci muita gente com quem trabalho hoje em dia, e alguns tornando-se grandes amigos. Acabei em 2003, conheci a Sara, a minha mulher, voltei para Lisboa, onde realmente comecei um pouco a minha carreira e pude tocar com alguns dos melhores músicos em Portugal. Essas experiências ajudaram a uma evolução e maturação algo rápida... Aos 25 voltei para Boston para fazer um mestrado no New England Conservatory, e 2 anos depois mudei-me para NY, onde tenho estado a maior parte do tempo, indo a Portugal regularmente, e tendo tido a oportunidade de viajar e tocar uma vez por outra, por vários países em diferentes continentes. Que mensagem ou sensações tentas passar na tua música? Não sei se tento passar alguma mensagem através da música. Talvez tente sim passar mensagens ou sensações pessoais para a música que faço. Ou seja, usar todas as minhas vivências, descobertas, estados de espírito, impressões sensoriais e canalizá-las para a música, talvez até quase como uma terapia. Trabalho mais no sentido de pensar naquilo que eu ponho na música, não no que depois essa música possa ou não transmitir. Por vezes os dois momentos acabam por ser concordantes. Que qualidades admiras num músico e o que é que define para ti um bom músico? Qualidades que admiro num músico são as mesmas que admiro em pessoas em geral: saber ouvir, estar presente no presente e respeitar o concreto. No Jazz, e não só, fala-se muito em respeitar a tradição. Que importância dás ao que se passou para trás? Achas que se respeita a tradição hoje em dia? Dou toda a importância. É fundamental ter uma perspectiva abrangente da música, das artes, da história, para compreendermos quem somos. No entanto, numa perspectiva académica, às vezes, pode tornar-se contraproducente demasiada análise, muita ponderação. E acima de tudo é bom dedicarmo-nos ao que gostamos, sem querer impôr isto ou aquilo só porque é a tradição. Demasiado respeito pode transformar-se em medo. E o medo é o que nos complica mais a vida. Ainda em relação à tradição, que corrente mais te influenciou e que discos e músicos foram/são uma inspiração para ti? Creedence Clearwater Revival, Beatles, Muddy Waters, John Lee Hooker, Lightin Hopkins, Dave Brubeck, Jim Hall, Wes Montgomery, Charles Mingus, Charlie Parker, Thelonious Monk, Billie Holiday, Pat Metheny, John Scofield, Charlie Haden, John Coltrane, Sun Ra, Charlie Christian, Carmen Mcrae, Olivier Messiaen, Derek Bailey, Carla Bley e todos os músicos com quem tenho tocado nos últimos 20 anos. E coisas extra-musicais que te inspiram? Família, amigos, Serra de Sintra, Praia da Arrifana, Lisboa, Hot Clube, Nova Iorque, livros policiais, livros de auto-ajuda, yoga e futebol. Que importância dás ao estudo? Praticaste muito enquanto estudante? Que conteúdos tinham mais ênfase na tua rotina diária? E hoje em dia o que é que praticas? Pratiquei bastante a certa altura, mas nunca estive 6 meses a praticar 8 horas por dia... Nessa altura, o desafio era conhecer melhor o instrumento, e aprender música. Hoje em dia a minha prática é muito mais focada. Por exemplo: faço exercícios muito lentos com o metrónomo, pratico voice leading com os ciclos do Mick Goodrick, transcrevo a Billie Holiday a cantar as melodias, por vezes passo algum tempo de volta duma frase que ouço do Charlie Christian. Tento estudar um pouco de clássico. E sobretudo aprender música, minha, da Sara, de outros amigos, bebop, baladas, choros, etc... Tiveste ou tens aqueles fantasmas de 'deveria ter estudado o músico x ou o conteúdo y'? Como contrarias isso? Não, e quando se põe alguma questão do género, o que faço é, com muita calma, aprender algo desse músico ou esse conteúdo. Toda a gente dá preferências a certas coisas ao longo dos anos, e hoje em dia já nem vejo o que fica de fora como lacunas, são apenas caminhos para explorar noutras ocasiões. Muitas vezes a questão da técnica do instrumento é confundida com número de notas por segundo. O que é para ti a técnica do instrumento? A capacidade ou a possibilidade de escolher o que tocas e como tocas. E som do instrumento? Que idealizas para o teu som? Usas algum pedal para ajudar? De uma forma concreta, está sempre a mudar, sendo que já assumi que tenho várias opções na manga. Por vezes atrai-me tocar o mais natural possível, só ligado ao amplificador sem mais adereços sonoros. Outras vezes, uso uma data de coisas para adornar o som. Depende sempre dos contextos em que toco, e sobretudo em NY, tenho oportunidade de tocar em situações, bandas e músicas muito distintas, por isso é bom ter a capacidade de mudar. O que é engraçado é que quando estou no momento penso sempre que é assim que vou tocar para sempre, para logo uns dias a seguir já pôr em causa tudo e mudar bastante. Mas há por exemplo dois ou três pedais que uso quase sempre, até porque me ajudam a encontrar um som que goste em qualquer amp, sobretudo quando viajo e toco em qualquer chaço que aparecer. Depois há a facto de tocar maioritariamente em 3 guitarras que têm personalidades muito vincadas, e vou alternando entre as 3. Tudo isto é indiferente pois na verdade, quem ouve de fora, não nota nem metade destas mariquices. Ficas nervoso quando entras em palco? Há sempre uma certa dose de adrenalina, mesmo quando se está absolutamente tranquilo e desperto. E às vezes sim, há algum nervosismo. Mas acho que hoje em dia, já em muitas ocasiões fui capaz de controlar isso, encontrando um estado de concentração e abertura que anulam qualquer impressão do que se passa ou se deva passar fora do palco. E tens ou já tiveste pensamentos parasitas que influenciam a tua prestação? Do género 'O que é que estou aqui a fazer?!' 'O público não se cala??' ou 'Está ali a pessoa X na plateia, tenho de tocar bem!'. Como dás a volta? Sim, tudo isso acho que faz parte da experiência de cada um. A tendência é crescermos e aprendermos a controlar isso, ou mesmo a não tocar gigs em lugares onde o público não se cala! Em relação a pessoas x e y na plateia, o ideal é tornar essa situação num estímulo para vivermos o presente e não ter na cabeça o que essa pessoa pode ou vai pensar, etc.. Aliás, porque se pusermos a situação na “grande fotografia”, nada disso interessa, é tudo passageiro. Somos todos mortais, ninguém te pode dizer que o que fazes é válido ou não. Se para ti for válido, já é suficiente para estares tranquilo e viver esse momento em grande. Ouves rádio? Não. Interessa-te a música que se faz em Portugal? Qual a tua opinião acerca disso? Em Portugal e todos os países onde já fui, tirando alguns, claro, há música que me interessa e música que não me interessa. Querias alguma coisa mais específica? O que andas a ouvir ultimamente? Ando a curtir estes discos: Mercedes Sousa (hasta la victoria), Pixinguinha (raízes do samba), Eduardo Falu (solos de guitarra), Russ Lossing (drum music), Roop Verma (Harmonie), Arvo Part (Adam´s Lament) Em jeito de despedida, fala-me do que andas a fazer actualmente e o que é que te imaginas a fazer daqui a 10 anos? Tenho investido em mais ou menos 3 projectos: o trio Lagarto (com o Demian Cabaud e o Colin Stranahan), o meu quarteto em NY (com o Jacob Sacks, Eivind Opsvik e o Billy Mintz) e o meu duo com a Sara Serpa. Também tenho contribuído com alguma música para os projectos da Sara, nomeadamente o Quinteto (com Kris Davis, Aryeh Kobrinsky, Tommy Crane e nós os dois). O disco dos Lagarto já está pronto, por enquanto pode ser ouvido e comprado em lagarto.bandcamp.com. Para breve, espero poder gravar o Quarteto e o Duo com a Sara. Nos últimos 2 anos, em paralelo, tenho vindo a participar em projectos (quer em NY como em Lisboa) com diferentes líderes tais como o João Lencastre, Gonçalo Marques, Greg Osby, Colin Stranahan, Jonathon Haffner, entre outros. Imagino-me a fazer um pouco o mesmo daqui a 10 anos. Só espero é que possa fazer cada vez mais até lá. Haja saúde! http://www.andrematosmusic.com/ Antes de mais fala-me um pouco de ti, do teu percurso. Comecei a tocar guitarra com 14 anos. Sempre gostei de música e fui exposto através do meu pai que tocou piano profissionalmente quando jovem, a vários tipo de música. Muito jazz, música brasileira e outros. Através do meu irmão mais velho ouvia rock e pop da altura, e foi por aí que comecei. Pouco depois tocava em grupos de covers por Lisboa e fora, entrei para o Hot e comecei a tocar jazz desde aí. Acabei o Hot, entrei com uma bolsa na Berklee em Boston com 19 anos e vivi uns meses em Nova Iorque. Voltei e comecei a tocar muito com muita gente de cá e de fora, até agora. O meu currículo está aqui: www.andrefernandes.com . Que mensagem ou sensações tentas passar na tua música? Serei bem sucedido se a minha musica inspirar alguém a ser melhor músico, e principalmente se ajudar alguém a ser mais feliz, mesmo que seja só enquanto a ouve. Que qualidades admiras num músico e o que é que define para ti um bom músico? Admiro principalmente a originalidade, voz própria e coragem de fazer algo seu, sem medo da opinião de outros e sem a necessidade de tocar algo que já foi aceite. Musicalmente admiro os músicos que tocam com intensidade e profundidade. Aqueles que fazem o que ouvem e que trabalham o suficiente para conseguirem transmitir-nos isso mesmo. Elementos que são para mim primordiais são o som, ritmo e inventividade melódica e harmónica. Tenho sérios problemas em ouvir música "certa" em que não haja algo de visceral na sua génese. Também tenho problemas em ouvir músicos mal preparados que se encostam à atitude ou "onda" para fazer música vazia, embora vistosa. O pior é ouvir alguém a apropriar-se da linguagem de outro fazendo do jazz uma musica de museu e/ou de reprodução ao vivo de algo que pertence a outra pessoa. Não havendo estas condições, sou muito aberto em relação ao que ouço. No Jazz, e não só, fala-se muito em respeitar a tradição. Que importância dás ao que se passou para trás? Achas que se respeita a tradição hoje em dia? Há várias tradições. Para cada um, alguma será relevante. O renegar o passado com o objectivo de ser moderno, contemporâneo ou actual é estúpido e demonstra, acho eu, medo de não ser suficientemente relevante ao lado dos que ficaram na história. Penso que há muitos músicos que respeitam a tradição, outros não. Também acho que reproduzir o que foi feito, de forma quase idêntica, não é respeitar a tradição. É usa-la em beneficio próprio. Pegar na tradição e integra-la no que somos parece-me mais interessante. Ainda em relação à tradição, que corrente mais te influenciou e que discos e músicos foram/são uma inspiração para ti? Lennie Tristano, Bill Evans, Lee Konitz, Jim Hall, Andrew Hill, Shorter, ... E coisas extra-musicais que te inspiram? As minhas filhas. A confirmação diária de que todos somos originais antes de ganharmos medo. E pessoas que vivem a vida em pleno, assumindo quem são, fazendo o que fazem ao mais alto nível que conseguem. Que importância dás ao estudo? Praticaste muito enquanto estudante? Que conteúdos tinham mais ênfase na tua rotina diária? E hoje em dia o que é que praticas? O estudo tem várias formas de existir. Não é só estudar escalas e acordes. Ou o instrumento. Mas é sempre o reflexo da tua dedicação à música. Enquanto estudante praticava muitas horas por dia, todos os dias. Hoje em dia não o faço tanto, ou não da mesma forma. Toco regularmente (não tanto quanto gostaria!), ensaio e escrevo música. Isso é a maior parte da minha relação diária com o instrumento hoje em dia. Enquanto estudante estudava tudo o que todos os músicos estudam (escalas, harmonia, técnica) e dava muito ênfase à composição. O som ocupou muito do meu tempo. Som e articulação. Ritmo na sua variedade, elasticidade e consistência foi e é das coisas que mais me interessam. Hoje em dia gosto de estudar sem a guitarra. Toco mentalmente. Ajuda-me em muitas coisas. Por mais bizarro que pareça. Tiveste ou tens aqueles fantasmas de 'deveria ter estudado o músico x ou o conteúdo y'? Como contrarias isso? Não tenho. Houve uma fase em que sentia que devia ter dedicado mais tempo a ter recursos que me permitissem tocar em "piloto automático", ou seja ter "chops" ou frases, clichés, a que pudesse recorrer para tocar eficazmente em qualquer situação, mesmo que fosse desinspirada. Depois percebi que isso não me interessava nada e fiquei mais feliz. E continuo a não ter esses recursos. Muitas vezes a questão da técnica do instrumento é confundida com número de notas por segundo. O que é para ti a técnica do instrumento? O som, expressividade e a articulação. E som do instrumento? Que idealizas para o teu som? Usas algum pedal para ajudar? O teu som é a tua voz. Acredito que 99% do som está nos teus dedos. Depois podes procurar a forma de o traduzir com um amplificador e efeitos de forma a torná-lo mais elaborado e consistente. Em relação a pedais a base que uso, e nem sempre, é um Reverb, Delay e Overdrive. Depois tenho outros sons ocasionais. O pedal Whammy aparece em bastantes discos que gravei. Mas uso cada vez menos. Ficas nervoso quando entras em palco? Quase nunca. Mas acontece por vezes. E tens ou já tiveste pensamentos parasitas que influenciam a tua prestação? Do género 'O que é que estou aqui a fazer?!' 'O público não se cala??' ou 'Está ali a pessoa X na plateia, tenho de tocar bem!'. Como dás a volta? Hoje em dia tenho menos e menos. Mas claro que já tive. São horríveis e parte de ser músico profissional implica a capacidade de conseguir entrar num espaço próprio em que não te deixas afectar por isso. O ruído é mais problemático se for exagerado. Isso pode ser mortal. Ouves rádio? Sim. Radio nostalgia, m80, radar e antena 2. Interessa-te a música que se faz em Portugal? Qual a tua opinião acerca disso? Claro que interessa. Gosto de imensas coisas e odeio outras tantas. Não é diferente do que sinto em relação à música internacional. O que andas a ouvir ultimamente? Perez Prado. Lembra-me a casa do meu avô e deixa qualquer um bem disposto. É óptimo para dançar com a minha filha mais velha. Que tem 4 anos. Isso diz muito da minha capacidade para dançar. Em jeito de despedida, fala-me do que andas a fazer actualmente e o que é que te imaginas a fazer daqui a 10 anos? Agora ando a tentar editar o disco que gravei com os Supertrouper (eu, Mário Delgado, Nelson Cascais, DJ Nery e Iago Fernández) de que gosto muito e o disco dos sPiLL. A minha banda de rock, de que também estou muito orgulhoso. Tenho feito algumas digressões com o grupo do Perico Sambeat e outras com o grupo do Iago Fernández. Daqui a 10 anos imagino-me a tentar editar o disco dos Supertrouper e o dos sPiLL. Estou a brincar. Espero estar a tocar o mais possível, a gravar discos e a escrever música. É o que adoro fazer, e não sei fazer mais nada.. Obrigado André!www.andrefernandes.com Tive a ideia de fazer uma entrevista por mês para dinamizar o blog. A ideia consiste em ter perguntas fixas independentemente do entrevistado. Para estrear esta nova secção desafiei o meu irmão, Bruno Santos, que prontamente respondeu. Desfrutem! P: Antes de mais fala-me um pouco de ti, do teu percurso. R: Comecei a tocar na tua terra com 15 anos. Aprendi com alguns amigos que já tocavam guitarra, depois fiz o percurso normal de quase todos os guitarristas. Comecei uma banda de rock com mais malta, tocámos versões, originais. O passo seguinte foi começar a ter aulas de guitarra, teoria. Primeiro numa escola privada, depois no Conservatório do Funchal. Com 19 ou 20 anos fui para o Algarve estudar Gestão de Empresas e simultaneamente entrei no Conservatório de Faro. A música começou a ser uma prioridade na minha vida, voltei para a Madeira, larguei Gestão de Empresas, estive uns meses no Conservatório do Funchal novamente e depois disso ingressei no Hot Clube. O Nuno Correia, contrabaixista madeirense que actualmente ensina também na escola do HCP, convenceu-me a ir para o Hot Clube e assim foi. Ingressei no HCP em 1998, comecei a dar lá aulas em 2000 tal como na Escola de Jazz do Barreiro. Entretanto entre 2001 e 2010 dei aulas no curso de jazz do Conservatório do Funchal. Em 2009 assumi a direcção pedagógica do Hot Clube onde me mantenho até hoje. Quando abriu a licenciatura em jazz na ESML fui convidado a dar aulas e lá continuo. Aproveitei e fiz o Mestrado em Música na ESML e presentemente estou a começar um Doutoramento em Artes Performativas. Tenho tocado um pouco pelo país todo e algumas saídas com projectos e músicos variados. Tenho 3 discos em meu nome, vou agora para o 4º e tenho participações em cerca de 10 discos. Apesar de ter falado mais do meu percurso académico considero-me um músico que dá aulas e não um professor que toca! Assim resumidamente é isto. Acho que se continuar ninguém vai ler até ao fim. Se chegaram até aqui parabéns! P: Que mensagem ou sensações tentas passar na tua música? R: Tento transmitir aquilo que me vai na alma, tento fazer boa música e tento que as pessoas se divirtam a ouvir a minha música. A mensagem é que quem ouça perceba que estou a fazer a música que imagino e gosto. Fico feliz quando gostam da minha música e quando as coisas saem como imagino. É por aí. Não tento passar mensagens subliminares se é isso que pretendes como resposta. P: Que qualidades admiras num músico e o que é que define para ti um bom músico? R: Alguém que faz boa música, que toca aquilo em que acredita seja jazz tradicional, jazz contemporâneo, rock, pop, ou qualquer estilo por muito bizarro que seja. Independentemente do estilo ou da qualidade ou quantidade de estudo dito tradicional o que interessa é o resultado final. Ou seja um autodidacta pode e é nalguns casos melhor músico do que alguém que tenha estudado durante muito tempo. O estudo não representa à partida que sejas melhor músico do que alguém que passou a vida toda a aprender sozinho. P: No Jazz, e não só, fala-se muito em respeitar a tradição. Que importância dás ao que se passou para trás? Achas que se respeita a tradição hoje em dia? R: Acho fundamental respeitar a tradição. Isso pode implicar não dominar a tradição, mas há que perceber o que se passou para trás também para perceber os tiques e especificidades desta música. Quer se queira quer não qualquer estilo musical tem os seus trejeitos e o jazz não foge à regra. Além disso, acho que para uma música tão ligada à improvisação é importante ver como as coisas foram evoluindo em termos de abordagem harmónica, melódica, rítmica, etc. Também acho que será mais fácil conhecer e abrir novos caminhos quando conhecemos o que se passou para trás, porque nos dá a possibilidade de ir a partir de determinada corrente ou abordagem, partir daí em busca de algo novo. Isso percebe-se claramente na evolução desta linguagem. Inovar a partir do que já foi feito. Sem isso é mais difícil. Quanto a respeitar ou não a tradição hoje em dia, é difícil responder, noto que eventualmente as gerações estão um pouco mais dispersas e conhecerão em menor profundidade alguns aspectos da tradição, o que é perfeitamente natural tendo em conta a quantidade de informação e música que está disponível hoje em dia. O facebook e youtube são prova disso mesmo, hoje em dia toda a gente põe música cá fora com grande facilidade. Por outro lado há uma grande corrente de músicos novos a fazer música original, variada e boa. Há muito mais coisas, penso que há maior dificuldade em ser muito específico ou perder-se muito tempo a ouvir ou conhecer algo em profundidade pela quantidade de informação que nos chega constantemente. P: Ainda em relação à tradição, que corrente mais te influenciou e que discos e músicos foram/são uma inspiração para ti? R: Muita coisa me influenciou. O 1º disco de jazz que ouvi foi do Pat Metheny e fiquei maluco com o som e as notas que tocava. A partir daí ouvi muita coisa distinta que me inspirou. Algumas coisas me marcaram mais por terem sido as 1ªs. Quando comecei a ouvir Tom Jobim percebi que havia uma sofisticação harmónica e melódica que eram distantes para mim. Ainda hoje em dia adoro a elegância dos temas dele. Por outro lado ouvi coisas muito menos sofisticadas nesse sentido mas que me influenciaram muito. Como objecto de estudo andei muitas horas à volta dos bopers e pós-bopers (Charlie Parker, Miles Davis, John Coltrane, Freddie Hubbard, Bill Evans, Red Garland, Wynton Kelly, Bud Powell, Wes Montgomery). Para mim foi muito importante ouvir esta malta toda de modo a decifrar coisas que não conseguia perceber só com o estudo das escalas e com as aulas de harmonia. Só nos discos é possível perceber e descodificar algumas coisas. Pelo menos para mim. P: E coisas extra-musicais que te inspiram? R: O facto de estar a fazer aquilo que gosto é uma força essencial para aqueles dias em que acordamos com mais dúvidas. Além disso e por exclusão de partes não queria fazer nada que não fosse o que faço hoje em dia. Isso para mim é uma inspiração. P: Que importância dás ao estudo? Praticaste muito enquanto estudante? Que conteúdos tinham mais ênfase na tua rotina diária? E hoje em dia o que é que praticas? R: Dou muito importância ao estudo. Penso que há fases para tudo. Durante muito tempo tinha uma espécie de rotina que repeti durante muito tempo adaptando-a em função do material a estudar. Mas percebi em pouco tempo que o mais importante era tocar, transcrever dos discos porque por mais que estudasse escalas, harmonia, etc., não havia maneira de fluir e de soar a alguma coisa parecida com o que ouvia nos discos. Aquilo a que dei mais importância foi mesmo aprender a linguagem, tentar aplicar aquilo que ouvia e transcrevia, procurar dar um cunho pessoal ao material que aprendia dos discos. A partir de determinada altura o meu estudo era basicamente resolver problemas que determinado tema ou repertório me apresentava. No entanto acho importante não descuidar a parte mais física, de ginásio, que eu considero mais chata mas muito importante. Hoje em dia continuo a praticar em função daquilo que acho que tenho menos consolidado. P: Tiveste ou tens aqueles fantasmas de 'deveria ter estudado o músico x ou o conteúdo y'? Como contrarias isso? R: Esses fantasmas são cada vez menores ou quase inexistentes. Penso que há uma altura na vida em que de facto percebi e conformei-me com o facto de não podermos tocar com todos, não podemos ouvir tudo, etc. Há que ir dia a dia e aproveitar ao máximo aquilo que vamos fazendo sem estarmos preocupados com o que ficou por fazer. Não tenho essa angústia ou ansiedade hoje em dia mas já a tive em tempos. P: Muitas vezes a questão da técnica do instrumento é confundida com número de notas por segundo. O que é para ti a técnica do instrumento? R: Técnica do instrumento não é só número de notas por segundo, estou de acordo com a 1ª parte da pergunta. Técnica do instrumento, a meu ver, engloba uma série de coisas como: som, articulação, destreza, rapidez, tempo sólido, versatilidade, etc. É um conjunto de factores que resultam numa fluência natural quando se ouve determinado instrumentista. Mas para mim tem muito a ver com a fluência com que se põe cá fora aquilo que queremos ou imaginamos. P: E som do instrumento? Que idealizas para o teu som? Usas algum pedal para ajudar? R: Como disse atrás é muito importante. Para mim é das coisas mais importantes, um mau som elimina à cabeça qualquer coisa de bom que se possa fazer porque um mau som ou um som desagradável afasta quem nos ouve e acaba por ser um filtro para aquilo que estamos a fazer. Ou seja o mau som acaba por ser o foco principal e tudo o resto fica para segundo plano. O que idealizo para o meu som? Não sei bem. Apenas procuro ter o melhor som possível independentemente das condições ou material. Uso alguns pedais mas pratico quase sempre acústico, mas claro que para alguns contextos os pedais podem usar mas não podem ser uma muleta. Uso pedal de volume, wahwah, distorção e uso tambem um processador de efeitos com um pouco de delay e reverb. P: Ficas nervoso quando entras em palco? R: Fico com aquele nervoso miudinho, umas vezes mais do que outras. Acho isso normal e lido muito bem com isso. É a adrenalina que nos mantém vivos e em cima da jogada. Acho que isso nunca vai passar e apesar de ser uma frase feita, acho que quando passar é sinal de que já não sinto o mesmo em relação à música. O nervosismo em determinada dose é bom porque nos deixa em estado de alerta. P: E tens ou já tiveste pensamentos parasitas que influenciam a tua prestação? Do género 'O que é que estou aqui a fazer?!' 'O público não se cala??' ou 'Está ali a pessoa X na plateia, tenho de tocar bem!'. Como dás a volta? R: Durante muitos e muitos anos esses pensamentos jogavam contra mim e apoderavam-se de mim. Hoje em dia confesso que já não penso nisso. Pode sempre acontecer algo do género, mas a importância que dou a isso é muito pouca. Penso sempre que tenho uma obrigação para quem está em palco ou para quem me está a ouvir (seja 1 ou 100 pessoas). Aquilo que tento fazer é abstrair-me de factores nocivos e “dar o litro”. A malta que está comigo em palco merece isso e o público também. Ao longo dos anos fui lidando com malta mais velha com quem aprendi a coisa de chegar ao palco e tocar, sendo essa a verdadeira preocupação. P: Ouves rádio? R: Raramente. P: Interessa-te a música que se faz em Portugal? Qual a tua opinião acerca disso? R: Acho que há música muito interessante a ser feita em Portugal, não só no jazz, se bem que a área que mais conheço é de facto a área do jazz. Nos últimos 10/12 anos, com o aparecimento de editoras (toap, clean feed) os músicos tiveram oportunidade e eventualmente a motivação que faltava para investirem mais nos seus projectos. Acho que há muita coisa boa a ser feita em Portugal, eventualmente estaremos a atingir uma fase em que há muita, muita coisa. O que não é necessariamente mau mas não sei se haverá espaço para todos. Espero que sim. P: O que andas a ouvir ultimamente? R: Ando a ouvir o meu disco sem parar, não para massagem do ego mas porque estou a tentar chegar a uma conclusão sobre a mistura final! Mais a sério, ouço sempre malta mais antiga. Para mim torna-se mais fácil ouvir malta antiga e partir daí. Ainda por cima há tanta coisa hoje em dia que tenho dificuldade em escolher para onde ir. Não sei se será por estas razões mas a verdade é que ouço muito mais malta antiga. Tenho sempre curiosidade em ouvir malta portuguesa com novos projectos mas confesso que se há uns anos conseguia acompanhar e ouvir os discos, hoje em dia já é mais difícil, exactamente por haver muita coisa. Em jeito de despedida, fala-me do que andas a fazer actualmente e o que é que te imaginas a fazer daqui a 10 anos? R: Ando a tentar acabar o meu disco, com música original para 10to. Está quase e penso que terei o disco cá fora lá para Março. Simultaneamente participo noutros projectos que estão para gravar ou editar novo disco (Mariana Norton, Joana Machado, André Carvalho). Daqui a 10 anos imagino-me a fazer o que faço hoje em dia. Tocar muito, compôr. Isso faz-me feliz. Mas como disse atrás gosto de pensar dia a dia, objectivos curtos (no tempo) ajudam-me a manter focado e não dispersar. Obrigado Mona! (ou Bruno se preferirem) www.brunomfsantos.com Vou estrear o blog a escrever sobre uma das minhas grandes inspirações, o guitarrista lendário Jim Hall. Hall nasceu a 4 de Dezembro de 1930, conta com 82 anos e é ainda um dos mais inspirados guitarristas de Jazz. Não se tratando de um virtuoso do instrumento é um improvisador nato e influenciou toda uma geração de guitarristas em variadíssimos aspectos (som, acordes, etc.) desde Ed Bickert até Pat Metheny ou Peter Bernstein. O seu som, maioritariamente acústico, é capaz de encher uma grande sala ouvindo-se o estalar da corda em cada nota que toca. Bastam 2 notas para se perceber que se trata de Jim Hall. Foi o guitarrista de músicos como Art Farmer, Paul Desmond ou Sonny Rollins. Tive o prazer de o ver por duas vezes ao vivo em Novembro de 2010 nas comemorações do seu 80º aniversário no clube de Jazz Nova Iorquino, Birdland.
Este blog servirá para partilhar coisas que me inspiram, podem ser pessoas, sítios, livros, músicas, etc. Servirá também para discutir todo o tipo de ideias, musicais ou extra-musicais.
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